quinta-feira, 19 de novembro de 2009

Nostalgia - Recortes

Eu sempre fui um menino agitado, hiperativo e muito comunicativo. Timidez esteve sempre longe de mim. Porém, minha mãe, sempre superprotetora e com seu primeiro filho, não facilitava para que eu saísse para a rua brincar. A redondeza também, não favorecia, geograficamente... assim, eu me tornei o que em Ponta Grossa a gente chama de "piá de prédio".

Com muita energia acumulada, tinha que descarregar em alguma coisa. O meu ladrão sempre foi a caneta. Em diversas superfícies, eu, que odiava lápis, punha minha imaginação para funcionar das mais diversas formas. Tudo o que se formava de imagem na minha cabeça estava em alguns segundos impresso em algum papel, livro, ou mesmo na parede. Minha mãe facilitava tanto, que quando ela via, eu já tinha desenhado na parede, escrito "campainha" sob o interruptor do corredor, tinha passado o formato de um transferidor na parede do quarto, e etc. Na altura da minha cabeça, a parede da minha casa chegou a um ponto em que parecia muro pichado. Mas tudo com caneta fina, caneta bic. Os meus pais faziam de tudo para evitar mas era difícil de conseguir.

isso aconteceu, até que um dia eu cresci um pouquinho, e com um resquício de consciência, comecei a me esforçar para tirar da parede com uma esponjinha e detergente o máximo de manchas que eu pudesse. Depois disso, não risquei mais a parede.

Com 7 anos, eu adorava fuçar os livros do meu Vô, e encontrei um livro super antigo, década de 1950, chamado Enciclopédia Universal Herder, em espanhol.  Lembro que o vô contou que comprou esse livro na época que um vendedor de livros daqueles chatos foi lá no banco em que ele trabalhava como gerente para vendê-lo. Meu Vô sempre teve o costume de ajudar muito as pessoas na medida do possível, e isso também incluía comprar coisas para ajudar.

Pois bem, nesse livro nada me parecia interessante, porque as letras eram super pequenas, e tudo em espanhol da Espanha, eu não entendia nada. Mas um dia, folheando o livro, eu encontrei uma tabelinha bem simples, com o alfabeto russo. Ou melhor, o alfabeto cirílico. E eu pensei: "Que legal!!!"...

Passei a copiar as letrinhas, e creio que em um ou dois dias, eu aprendi o alfabeto russo! Claro que não de forma totalmente correta, mas eu, com mania de louco, comecei a escrever um monte de coisas em russo, começando pelo meu nome. Eu nunca mais esqueci o alfabeto russo. Mas simplesmente, depois disso, eu não tive muito mais interesse.

Falando nisso, eu costumo não ter interesse e persistir em coisas que eu não aprenda instantaneamente ou não tenha um benefício muito grande pela frente. Essa autodidaxia que parece bonita é muitas vezes um grande defeito meu.

Passaram-se 17 anos (!), e eu, com 24 anos, no Japão, resolvi fazer curso de língua na universidade.
O primeiro propósito foi o seguinte: eu, sufocado com o sistema japonês, e pessoas me olhando de forma desconfiada, resolvi tomar aulas de idiomas que a universidade oferece. São simplesmente matérias de 90 minutos por semana e no sistema mais primitivo de todos, sem muitos recursos visuais, algo bem simples mesmo. Eu ia fazer francês ou alemão, só para ter uma base, pois não se aprende muito com tão pouca aula. Mas os horários não bateram, e eu escolhi italiano e RUSSO...

Sendo o professor um cara da Rússia, supus ser mais efetivo aprender com ele, e também me deixava feliz o fato de acreditar que ele seria uma pessoa amigável e não estúpida ou seca como as pessoas que eu venho encontrando todo dia no âmbito acadêmico puramente japonês.

Na primeira aula de russo, foi pura nostalgia... lembrei do dia que estava sentado na mesa de jantar da casa da Vó aprendendo o alfabeto russo. Eu ainda não aprendi quase nada de russo, e nem sei se vou aprender, mas uma coisa eu garanto: me dá, tipo, um minutinho, e eu leio pra você a frase em russo que você me trouxer, com o mínimo possível de erros. E, acredite ou não, parte da minha felicidade se forma a partir desses caquinhos de sabedoria!

Até mais!

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